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– Eu tive um tio doido, oficialmente falando. Não sei se você sabe.
– Doido, tipo… psiquiátrico?
– Eu fui muitas vezes à Colônia Juliano Moreira durante a infância e a adolescência – para vi-si-tar.
– Hahahaha
– Imagino que, pela idade, ele tenha encarado alguns dos processos de tratamento mais medievais, comuníssimos. Há quem aposte em mediunidade ignorada, enfim.
– Eletrochoque etc?
– Não tenho detalhes. A cada visita eu era reapresentado, pois ele só lembrava dos mais velhos.
– Tadinho… sacanagem levar uma criança para ver isso, podia ficar impressionado.
– Eu curtia o passeio, só tinha vergonha de comentar no colégio, claro. Criança é a perversidade encarnada. Se na 5ª Série eu já era chamado de mongolóide por ficar com o casado esticado, escorando a cabeça, imagine se soubessem disso.
– Ah, ser chamado de mongolóide é básico. Bem-vindo ao clube. Eu perdi a conta dos meus apelidos lindos de infância.
– Na 7ª eu era chamado de comunista.
– Comunista? Haha por quê?
– Com o ambiente caseiro politizado, teimei em levar isso ao colégio, bancando o esquerdista, aquela coisa. Mas o apelido mais estranho foi “Peido”, que eu juro não ser por isso. Veio de uma menina mais nova, tosca, hoje em dia policial civil. De um ano anterior ao meu, do nada, ela passou a falar quando eu passava “Lá vem o Peido!”
– HAHAHAHAHAHAHA de onde essa criatura tirou isso… hahahahahahaha
– Aliás, lembrei de outro, pior, “Fezes Negras”.
– Por favor, pelo menos esse deve ter tido motivo. Ou então você estudava com um bando de doidos escatológicos.
– Não veio do colégio, mas da casa de uma amiga da minha irmã – onze anos mais velha –, enquanto eu brincava com alguns gatos, correndo de um lado para o outro. Em dado momento, aparecendo repentinamente para a roda que conversava num quarto, todo de preto e em frente ao banheiro, um dos presentes “Lá vem Fezes Negras, saindo das entranhas mais profundas do vaso sanitário!”
– Hahahahahahahahahahahahahaha imagino o quanto você adorava o apelido.
– Só não pegou de vez porque era um grupo mais velho, com o qual eu não tinha contato. Mas cheguei a ouvir um pouco.
– Bom, você pode ver os meus, que lindos: Orca vesga, Nicinha, Vovó Zilda (Família Dinossauro) e mais uns duzentos que meu cérebro fez o favor de apagar.
– Não tive muitos, até porque “Zé” já vem de fábrica.

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